segunda-feira, 16 de março de 2015

Transgressividade #3: Necrophile Passion (2013)

Caoa de Necrophile Passion
Necrofilia é um tema raramente abordado no cinema, sem dúvida. Apenas em 1987, quando Jörg Buttgereit lançou o clássico Nekromantik, se pôde contemplar na magnificência das telonas a necrofilia. Naquele ano, um dos tabus moralistas do cinema se quebrava.

Apenas após mais de 20 anos depois do lançamento de Nekromantik é que um novo diretor decide voltar a fazer um filme sobre o assunto. E é aqui que Necrophile Passion entra. 

O que se pode se esperar de Necrophile Passion? Um remake de Nekromantik? A repetição chula do mesmo enredo? Não. O crânio por trás dessa história, Tom Heidenberg, definitivamente, não faz isso.

O filme é dividido em 6 capítulos. O primeiro capítulo se chama Obituário. O filme nos mostra um homem (Günther Brandl) que perdeu todo o sentido da vida. Vagando por entre a floresta, ele encontra um corpo nu (e morto) de uma garota. 

Inicialmente, ele pensa em chamar a polícia, mas tomado por desejos enterrados no seu subconsciente, ele decide levar aquele corpo para sua casa. Já em casa, ele coloca o corpo da mulher no chão. Após um curto espaço de tempo, ele abaixa a bermuda e começa a fazer sexo com o cadáver que - perceptivelmente - ainda está fresco.

O segundo capítulo se chama Dor. Nele podemos ver o homem tendo recordações de sua infância. Onde o seu pai o abandonou e o deixou com sua mãe, que nada mais sabia fazer além de ter acessos de raiva e fazer insultos à ele. Também podemos ver a forma como sua namorada o trata. O sentimento de renegado que assombra o homem durante esse capítulo.

Em determinado momento, ele pergunta à ela: "Você não me ama mais?", e ela responde: "Você realmente acha que isso é amor?", e completa: "A única coisa que nos une é a dor... e a humilhação".

Esse segundo capítulo é um prelúdio da transformação na vida do homem. Em certo ponto, o protagonista até aparenta ser uma vítima. Um sujeito que tornou-se o que é pela dor que foi impelido a ter durante sua existência.

O terceiro capítulo se chama Isolamento. O capítulo inicia com o homem tendo visões de uma mulher transando com um cadáver já decomposto. Após isso, ele começa a ver uma outra mulher sendo cortada.

Porém, só se torna claro quem é a mulher que suas visões querem se referir quando ele liga a TV. Ao ligá-la - apesar do sinal estar fora do ar - ele imagina estar presenciando a cena da própria namorada transando com um cadáver em decomposição. 

Ela, olhando para ele por entre a tela, diz: "é o cheiro da putrefação que me excita", como a dizer que o cadáver lhe dava muito mais prazer que ele. Ele não era capaz de satisfazê-la. 

Com isso, ele desliga a TV. Uma voz surge em sua cabeça, dizendo: "quer você goste ou não, sou uma parte de você. De você todo. Veste-se. Sentado ali, colado à sua cadeira. Você senta ali, comendo e bebendo. Sem vida, observando esta tragédia de amor, morte e solidão. Acha que tudo isso é doença? Retrata-se como sendo inocente? Dê uma boa olhada para si mesmo no espelho, e então, julgue de novo. Todos e cada um de vocês contribuem para isso. E você também. Brutalidade usada contra os fracos. Crianças morrem por nada. O homem, o animal. Você não é nada!".

É perceptível aqui uma crítica velada à certas características da sociedade. Mas não apenas isso, esse trecho clarifica a putrefação do homem. A natureza humana: podre, imunda, asquerosa.


O quarto capítulo se chama Amor. Nesse capítulo se retrata o processo do namoro. Desde o conhecimento até o período de renegação. Um fator interessante é a rosa que é mostrada no início do capítulo. Desabrochando, como a representar a beleza do início do namoro, ao passo que poucos minutos depois ela novamente aparece, porém, dessa vez ela está murchando, representando o declínio do namoro. O mesmo acontece com uma vela, que no início aparece acesa, e no final uma mão aparece apagando-a.

O quinto capítulo se chama Ódio. Em determinado momento, o homem começa a divagar. Comparar o seu namoro ao de seus amigos, que não brigavam. Até que, novamente, ele ouve a voz: "foi ela que destruiu você. Ela te transformou no que você é agora. Mas há algo que você pode fazer a respeito", e ele responde: "eu vejo. E o que seria isso?", e a voz retruca: "você não é estúpido, não é? Pense!".

Nesse momento, ele se encaminha à cozinha e vai em direção ao porta-facas. Ao focalizar a câmera, ouvimos a voz dizer: "sim". Ele então volta para sala e ameaça cortar o braço verticalmente, onde se encontra as veias. Mas antes que ele fizesse isso, a voz volta e diz: "não. Não foi isso que eu quis dizer". Só então que ele percebe o que deve fazer.

Ele liga para ela e pede que ela venha à sua casa para conversarem. A campainha toca, ele se encaminha à porta com a faca em mãos. Porém, ao abrir a porta, antes mesmo de que ele pudesse fazer qualquer movimento, ela faz um corte em sua garganta com um canivete.

O sexto e último capítulo se chama Consequências. Esse capítulo é inteiramente rodado na cena da namorada se satisfazendo com o corpo do homem. Aí você me pergunta: consequências do que, especificamente? Provavelmente, consequências de uma vida marcada pela dor e pelo sofrimento que culminaram na insanidade do protagonista.

Tom Heidenberg exemplifica esse processo e afirma o quão poderosa são as interferências que as pessoas podem fazer na sua vida. No que elas podem nos transformar.

E aqui o filme termina. As atuações de Necrophile Passion não são lá essas coisas. As atrizes que representam os corpos mortos deixaram a desejar. A única exceção é a atriz Eldrid Remy, que incorpora o asco que tem pelo homem com uma primazia tremenda.

O ponto mais forte e digno de exaltação de Necrophile Passion é a trilha-sonora. O trabalho de René Bidmon nesse filme foi primoroso. Dá um ar de tensão incrível e que acompanha lindamente a perturbação do personagem central.

Apesar de não ter a técnica e o profissionalismo de Nekromantik, esse filme é uma ótima pedida para o tema. Nele o telespectador poderá ver introspecções e demais fatores que não se encontram nem no clássico de 87.

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